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A DAMA DA NOITE
Em uma Vara do Trabalho de Porto Alegre realiza-se a audiência de instrução de ação em que o reclamante (do sexo masculino) postula a nulidade da sua despedida por justa causa. A reclamada – conhecida loja de departamentos – sustenta que o trabalhador demitido usara indevidamente um cartão de descontos fornecido para que pudesse comprar, com preços promocionais e cobrança parcelada no salário, “roupas e outras peças para uso próprio” (grifou-se).
No ponto, a contestação é minuciosa: “o sistema de imagens de segurança da empresa gravou o reclamante comprando e pagando, num dos caixas do pavimento superior, roupas íntimas e um par de sapatos femininos de salto alto – peças que, seguramente, não são de seu uso pessoal”.
Detalhe: a contestação está acompanhada de um CD Rom com as imagens mencionadas.
O juiz questiona os advogados sobre a intenção de produzirem prova testemunhal. O procurador da reclamada afirma querer ouvir testemunhas, sustentando que, “como não foram admitidas as imagens gravadas, a empresa pretende demonstrar com a prova oral que o reclamante efetivamente comprou itens para outrem, já que eram vestimentas e calçados femininos”.
O magistrado atalha:
- Antes vou colher o depoimento pessoal do reclamante.
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- O senhor admite ter comprado, com o cartão de descontos da empresa, peças para outras pessoas?
- Não, doutor, eu não faria isto jamais.
- Mas a empresa alega ter prova de que o senhor pagou calcinhas, sutiãs e um par de sapatos femininos com o cartão de desconto.
- Sim, eu comprei essas peças.
- O senhor, então, retifica a resposta anterior, pois agora acabou de me dizer que comprou peças que – presumo – não são para o seu uso pessoal…
- Não, doutor. Eu não retifico! Eu comprei essas coisas para mim…
Há um silêncio e uma inquietação na sala de audiências. Em seguida a surpresa.
- Eu sou homem, mas eu gosto dessas coisas e as uso à noite – diz o reclamante, polido, face rubra, visivelmente constrangido.
A instrução é encerrada. Prolatada a sentença, o juiz desacolhe a tese da defesa e anula a justa causa aplicada ao reclamante. Meses depois, o TRT-4 nega provimento ao recurso ordinário da empresa, reafirmando “a liberdade sexual e a preservação da intimidade como princípios constitucionais”.
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No início deste mês de setembro, o reclamante recebeu todos os haveres postulados.
Fonte: Espaço Vital